Rendering e Economia Circular: como transformar resíduos em valor sustentável na cadeia de proteínas
- Adauto Pereira Gomes Neto
- 4 de set.
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No cenário atual de crescentes desafios ambientais e da necessidade de sistemas de produção mais sustentáveis, a indústria de proteínas busca soluções inovadoras. É nesse contexto que o rendering, um processo com séculos de aplicação, se afirma como pilar da economia circular na cadeia de proteínas, transformando resíduos em valor sustentável e estratégico.
O papel do rendering na economia circular
A economia circular propõe um modelo que reduz desperdícios, mantém recursos em uso por mais tempo e regenera sistemas naturais. Diferente do modelo linear tradicional, caracterizado pelo ciclo produzir, usar e descartar, a circularidade busca maximizar o valor dos recursos em cada etapa do processo produtivo (FAO, 2022). O rendering é uma das expressões mais consistentes desse conceito. Ao recuperar e processar coprodutos e subprodutos de origem animal, o setor evita que milhões de toneladas de materiais orgânicos sejam descartados em aterros sanitários e os converte em ingredientes de alto valor nutricional e energético, como farinhas e gorduras (JG PEARS, s.d.). Estima-se que mais de 99% do material enviado ao rendering seja aproveitado de forma útil, o que demonstra sua relevância ambiental e econômica.
Indicadores da FAO para medir circularidade na pecuária
A FAO, por meio da Livestock Environmental Assessment and Performance Partnership (LEAP), vem desenvolvendo diretrizes globais para medir a circularidade na pecuária, atualmente em revisão pública (FAO, 2024). Entre os indicadores aplicáveis destacam-se o Nutrient Use Efficiency (NUE), que mede a eficiência no uso de nutrientes, o Nutrient Recycling Index (NRI), que avalia a proporção de nutrientes reaproveitados, e os Circularity Indicators (ICirc), que reúnem métricas de uso sustentável de recursos. Esses parâmetros fornecem base científica para demonstrar como o rendering fecha ciclos de nutrientes e carbono, consolidando-se como prática essencial da bioeconomia circular.
Como o rendering reduz a pegada de carbono e promove eficiência
O rendering é uma solução ambiental estratégica que gera farinhas proteicas, óleos e gorduras para diferentes indústrias, além de biocombustíveis. Estudos indicam que o biodiesel e o diesel renovável obtidos de gorduras de origem animal reduzem as emissões de gases de efeito estufa entre 79% e 86% em comparação ao diesel fóssil (XU et al., 2022). Substituir de 11% a 16% das culturas energéticas por ingredientes derivados do rendering pode poupar até 27,8 milhões de hectares de solo e 137,8 km³ de água (GIOVONI et al., 2023). Além disso, as farinhas de origem animal oferecem proteínas de alta qualidade, cálcio, fósforo e aminoácidos essenciais, enquanto as gorduras melhoram a palatabilidade e a eficiência energética das dietas (FEED AND ADDITIVE, 2023). Outro ponto relevante é a segurança alimentar, pois o processamento térmico elimina patógenos e garante a inocuidade dos ingredientes destinados à alimentação de animais de produção e de estimação.
Brasil no mercado global de rendering: posicionamento e perspectivas
Como um dos maiores produtores de proteínas do mundo, o Brasil ocupa posição estratégica no rendering global. A capacidade de processar grandes volumes de coprodutos torna o país essencial para o equilíbrio da oferta mundial de farinhas e gorduras. De acordo com Cypriano (2023), o Brasil vem consolidando presença internacional com crescimento nas exportações e alinhamento às exigências de mercados globais em rastreabilidade e sustentabilidade. A Associação Brasileira de Reciclagem Animal (ABRA) tem papel central nesse processo, promovendo padronização, representatividade institucional e integração do setor às pautas de economia circular e descarbonização. Esse posicionamento projeta o país não apenas como fornecedor de matérias-primas, mas também como protagonista de um setor estratégico para a bioeconomia global.
Considerações finais
O rendering, ao integrar práticas industriais consolidadas a conceitos de economia circular, evidencia seu papel como tecnologia indispensável para a sustentabilidade da cadeia de proteínas. A valorização de coprodutos e subprodutos animais por meio do processamento industrial representa não apenas ganhos ambientais e econômicos, mas também um diferencial competitivo para países e empresas. A continuidade desse processo dependerá da capacidade de consolidar métricas globais, como as da FAO LEAP, e de fortalecer a atuação institucional em âmbito nacional e internacional. Nesse cenário, o Brasil e empresas como a AniVertis têm a oportunidade de protagonizar a transição para modelos produtivos mais eficientes, transparentes e sustentáveis.
Referências
CYPRIANO, L. Brazilian Animal Rendering: The Brazilian Market. Washington: North American Renderers Association, 2023. Disponível em: https://nara.org/. Acesso em: 04 set. 2025.
FAO. Food safety in a circular economy. Rome: Food and Agriculture Organization of the United Nations, 2022. Disponível em: https://openknowledge.fao.org/. Acesso em: 04 set. 2025.
FAO. Role of livestock in circular bioeconomy systems: draft guidelines for public review. Rome: Food and Agriculture Organization of the United Nations, LEAP Partnership, 2024. Disponível em: https://fao.org. Acesso em: 04 set. 2025.
FEED AND ADDITIVE. Beyond Waste: How rendering drives sustainability in animal agriculture. Feed & Additive, 2023. Disponível em: https://www.feedandadditive.com/. Acesso em: 04 set. 2025.
GIOVONI, M. et al. Circular strategies in animal agriculture: land and water savings from rendering. Journal of Environmental Management, v. 327, p. 116-134, 2023.
JG PEARS. Rendering in the Circular Economy. UK: JG Pears Group, s.d. Disponível em: https://jgpears.com/. Acesso em: 04 set. 2025.
XU, Y. et al. Greenhouse gas reduction from renewable diesel derived from animal fats. Renewable Energy, v. 195, p. 1025-1037, 2022.
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